Na linguagem popular ficou celebrizada a frase: “quem tem um, não tem nenhum”! Nem sempre ela é válida, mas no caso da ovinocultura leiteira do estado de Santa Catarina, essa frase assumiu o ar de uma dolorosa verdade no último ano. O estado, um dos maiores produtores de leite de ovelha do país, inclusive sendo sede da Associação Brasileira de Ovinocultura de Leite, entidade presidida pelo criador Erico Tormen, da Cabanha Chapecó, por causa de uma fusão empresarial entre grandes laticínios, da noite para o dia, se viu privada de uma planta de beneficiamento de leite com selo SIF, e passou de um estado próspero e exportador de leite e derivados, para um que luta agora para se renovar e reformular sua atividade.
Tomando como fonte uma reportagem de 2011 desta mesma Revista Cabra & Ovelha, o estado de SC possuía cerca de 2.800 ovelhas leiteiras, que produziam em média 600 litros de leite de ovelha por dia, um total de mais de 200 mil litros anuais. E a tendência era de crescimento. Por conta disso, o planejamento da entidade para os anos seguintes era a da implantação de um programa de melhoramento genético e redução de tributos na comercialização do leite e derivados e a quantidade de pequenos produtores que ingressavam na atividade só crescia.
Estava tudo bem, mas, no entanto, uma pedra se pôs no meio do caminho. A usina que tinha acordo com os produtores de leite ovino e mantinha uma planta com selo SIF para o processamento do leite de ovelha foi vendida. A empresa compradora é um dos maiores laticínios do Brasil, e este, por uma política de mercado diferente, não demonstrou interesse em manter a atividade com leite ovino.
Este fato teve uma repercussão imediata segundo o gerente da Cabanha Chapecó, Anderson Antônio de Queiros. “O preço do leite despencou no estado”, lamenta. Enquanto que em estados como o Rio de Janeiro, os produtores atualmente vendem o produto a R$ 5 o litro, e os produtores gaúchos da Região da Serra tem recebido cerca de R$ 3,80 pelo litro do leite, os produtores catarinenses passaram a amargar R$ 2, que estão sendo pagos pelo litro produzido. A produção não é viável de ser transferida para outros estados, pois o frete torna a atividade insustentável, restando assim o uso de um único laticínio, mas apenas com inspeção estadual, fato que fez reverter o processo de expansão da atividade, que antes estava em franco desenvolvimento.
A busca por soluções exige criatividade
No estado de Santa Catarina o setor está em uma fase de reorganização e os principais produtores não desistiram. As maiores produtoras de leite da região são a própria Cabanha Chapecó, e também a Cabanha Três Fronteiras. Neste sentido, a já mencionada adoção de uma usina com amplitude estadual foi a primeira opção. E assim ocorreu uma parceria com a empresa Gran Paladare, que produz queijos nobres da cidade de Chapecó/SC, que adquire o leite para fazer o queijo Pecorino. A segunda opção está no aproveitamento do potencial do leite como produto para venda a partir da verticalização do sistema de beneficiamento da Cabanha Chapecó. Segundo Anderson Queiros, a ação imediata é a montagem de uma unidade de processamento capaz de produzir sorvetes e iogurtes à base de leite de ovelha, para a comercialização na cidade de Chapecó/SC.
A Cabanha Chapecó mantém uma média de produção anual de 300 litros ao dia, logicamente distribuídos entre os períodos de lactação, e o novo empreendimento será chamado de “Mundo da Ovelha”, e tem previsão para abertura oficial em breve. “A cidade tem cerca de 200 mil habitantes e é um centro importante na região. Com a loja aberta, ela sozinha poderá absorver toda a produção da nossa propriedade”, planeja Anderson.
O rebanho atual da Chapecó é de 1.200 animais das raças Lacaune, Ile de France e Texel, sendo as raças de carne para a produção de animais. A propriedade ocupa uma área de 50 hectares, sendo metade destinada para as ovelhas e a outra destinada para a formação de forrageiras. Ela é uma das poucas propriedades da região a trabalhar exclusivamente com ovinos, enquanto as demais unidades de negócios rurais locais integram outras culturas e criações. Por conta disso, tem sido considerável o número de criadores que deixaram de lado a atividade em favor da criação de frangos, suínos e bovinos de leite, aguardando uma nova oportunidade para o retorno à ovinocultura.
Há uma necessidade urgente de que alguma unidade produtiva se posicione favoravelmente à produção de leite de ovelha e seus derivados, com selo de inspeção federal (SIF), para que a situação prejudicial se reverta e seja possível a recuperação do rebanho catarinense, e a continuidade de um processo que parecia ser uma das mais promissoras do país. Quem sabe, através desta reportagem, e da proporção que o problema vem tomando em SC, este assunto venha a compor a pauta das próximas reuniões das câmaras setoriais estaduais e federal de caprinos e ovinos, e assim, seja possível o encaminhamento de uma solução mais produtiva para SC e para o país.
Fonte: Revista Cabra e Ovelha